Publiquei o último texto aqui há um mês. O plano era postar uma vez por semana. Falhei.
Não é o fim do mundo, mas - ah! -, dá aquela sensação de putaqueopariu mais uma coisa que falei que ia fazer e não fiz.
Sou mestre nisso. Vou gravar uma música, escrever um conto, limpar o armário. Nada de música, conto ou armário. A culpa transborda em meu poço de autopiedade.
Sento em frente ao teclado. Aquele clichê da barrinha preta piscando. Eu molhei minhas plantas? Presta atenção, Leo. Acho que esqueci de regar minhas plantas. Vou fazer isso agora.
Plantas regadas, pronto. A barrinha continua piscando. Não sei o que escrever. Por que escrever? Porque quero ser escritor. E um escritor que não escreve é escritor? Um escritor que não é lido é escritor? Um escritor precisa ser lido para ser escritor?
Saio para dar uma volta. Para escrever bem, é preciso vivenciar o mundo. Buscar inspiração no ordinário. Uma moto passa por mim berrando; um pombo bate as asas na minha cabeça. Gente, como isso vai me ajudar a escrever?
Volto para o teclado e começo a apertar algumas teclas. Agora vai. Apaga-apaga-apaga. Não tenho um tema. Já sei! Vou falar sobre isso: não saber o que escrever. Quem vai ler isso? Sei lá, não importa.
O primeiro rascunho sai como um guia de autoajuda para escritores em bloqueio. Releio e apago tudo. Não quero dar dicas de escrita - porra, sou EU quem precisa de ajuda!!!!!!!
Abro uma aba no navegador e leio um texto da Margaret Atwood sobre storytelling. Contar histórias é contar mentiras. Foi ela quem disse, não eu.
Contar histórias… porra, é isso. Quero contar uma história, não fazer um texto com dicas de escrita. Sem desmerecer tais textos. Adoro, leio vários.
Você quer dicas? Toma:
leia de forma obscena
escreva num diário
anote ideias num bloquinho
copie textos de escritoras que admira
faça um pacto com belzebu
Pronto. Dicas. Bichinho do SEO alimentado.
Travei de novo. Resolvi varrer o chão. Dizem que tirar a cabeça do que se está escrevendo ajuda a sair do bloqueio. Meio que um paradoxo literário: pare de escrever para escrever melhor. O pior é que ajuda.
Disse que não ia fazer um post com dicas, mas é exatamente isso que estou fazendo. Cadê a história? Aqui vai uma:
Outro dia saí para almoçar com um amigo. Eu nem ia almoçar, mas que mal faz um pratinho leve de salada? Eu digo o mal que faz: paguei 25 reais num pratinho leve de salada. Pelo menos a conversa - e a salada - estavam boas.
Passo no mercado - outra facada. Depois de pagar, na rua, sacolas na mão, bate uma vontade de ir no sebo (sou compulsivo quando se trata de sebos) porque, sei lá, instinto? Não é instinto, Leo, é fogo no cu! Já não basta o pratinho leve de salada e o mercado, vai gastar mais dinheiro em livros que não vai ler?
Volto pra casa. No Instagram, vejo nos stories as novidades do sebo1: O Conto da Aia e A Sociedade do Espetáculo. Dois livros que quero ler, com preços ótimos. Era instinto, afinal.
No dia seguinte volto ao sebo - os livros foram vendidos. Mas a sorte é engraçada: quando você acha que deu azar, na verdade estava abrindo caminho para o destino. No meio dos trilhões de livros da banca, encontro um livro de escrita criativa2, que - supostamente - vai me ajudar a escrever melhor.
Talvez agora eu saiba o que escrever. Talvez agora eu não falhe como escritor. Talvez eu esteja depositando muita esperança num livro que mal comecei a ler.
Falhei como escritor - e vou falhar ainda muitas vezes. Mas escrevi este texto. Você pode não ter gostado, e tudo bem. Amanhã posso odiá-lo também. Mas aí é outra história.
E, quem sabe, eu falhe em odiá-lo - o que não é um fracasso tão ruim assim.
O sebo em questão é o Sebo Rua das Flores. Dá pra comprar pelo perfil deles no Instagram!
Leonardo toca na ferida. Para quem tem a sina de amar as Letras, é cruento se dar conta das linhas que custam para serem escritas. A angústia do Leonardo me faz lembrar uma história que ouvi quando era menino. Em um início de noite, duas borboletas caem em diferentes barris de leite. A primeira permanece imóvel e diz: “Vou me afogar”! A segunda não para de se debater e só repete “Não vou me afogar”! Quando amanhece, a segunda borboleta jaz no fundo do barril. Morta. Já a segunda está viva e a boiar por cima da nata; pronta para novo dia. Leonardo sente que não consegue escrever. E vai dar uma volta e lê textos de auxílio para escritores e varre o chão e se debate, debate, debate... E quando o dia amanhece, lá está o texto dele. Postado. Oferecido ao mundo. Linhas de alta qualidade. A segunda borboleta e o escritor provavelmente ficaram exaustos, talvez receosos de cair em outros barris. Contudo, estão lá. E nós, leitores, a espera deles.
Ai gente! Que texto ótimo! Desculpe, Leo, mas ri da sua desgraça! hahahaha
Escolhi ler este porque este com certeza é o tema que todo escritor já visitou...
Mas fiquei curiosa em saber se o livro surtiu efeito!!! haha